quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Porque eu quero poder continuar a ser professora.




  Há dias assim, dias assim-assim e dias não. Todos os têm, pois claro…nem digo que não.
Mas eu tenho dias em que a minha vida passa sem mim e esta ausência da minha vida é frustrante.
Não quero esta vida minha, sem mim. O que significa este tempo que passa e eu não estou? Este tempo fora.

  Há dias em que passo os portões da minha escola, que cada vez sinto menos minha, às 8h15….e o tempo passa, corre e acaba. Por vezes acaba tão tarde e volto a passar o mesmo portão em sentido contrário, doze horas depois. O único sinal da minha passagem por là, ida e volta, é o toque que pontua entradas e a saídas. Passei lá o meu dia, doze horas da minha vida, a fazer o quê?

  Pois bem, alguns poucos dirão que estive talvez a trabalhar, talvez…

  Porque  até eu , por vezes duvido…

  Quando comecei este trabalho, eu não o via assim, não me sentia assim e é assim que eu não o quero ver.

  Passo muito pouco do meu tempo com os meus alunos, a ensinar-lhes.
  Passo muito tempo a preencher papelada e a contribuir para alimentar a máquina burocrática. Passo muito tempo a contribuir para a desflorestação e em reuniões.

  Quando dou por mim é porque tenho fome e sono e estou cansada. Só nestes momentos tenho consciência de mim. Estarei sob o efeito de alguma anestesia?

  Quando  me falam em avaliação, até me dá vontade de rir. Nem percebo o que pretendem de mim…Estarei apta a dar convenientemente 3 aulas por ano e preencher outros tantos formulários? Depois de anos a fazê-lo, dou por mim a não saber fazer o que sempre fiz…

  E depois desta avaliação que não poderá ser outra que muito boa…porque terei gasto as pestanas a fazer os planos de aulas, que tanto vão beneficiar os meus alunos e fazê-los crescer, os objectivos que irão enriquecer a comunidade, que nunca voltará a ser a mesma e  a revolucionar a escola?
  Depois, dir-me-hão que nao tive muito bom ou excelente porque não, porque explodi com as percentagens disponíveis e que nâo havia para todos. Mérito, por aqui se desconhece.

  Como será a avaliação que as minhas filhas farão de mim?
Péssima, porque terei abdicado delas e do tempo que lhes devo para servir ninguém, numa absurda burocracia inútil.
Inútil, é como me sinto.
  Nos dias em que elas estiverem doentes…não poderei ficar com elas. Até as vou mandar para a escola, ainda débeis, se for possível. Irão contaminar os filhos dos outros, e preferência, os filhos dos que podem ficar com eles.
  Uma, tem a infeliz ideia de ter mais do que 11 anos e a outra tem o mau gosto de frequentar um pediatra que não trabalha para o SN de saúde e não tem contrato com a excelente ADSE.…
  Um dia despedem-me com justa causa…
Carinhos à pressa com hora marcada. Sim porque tenho que corrigir testes ou fazê-los. Idas ao cinema…nem pensar, porque me sinto culpada por não estar a trabalhar, ficarei a pensar nos filmes que poderia ter visto.
E se os meus pais adoecem…paciência! A culpa é deles…quem lhes mandou incentivar alguém a ser professora?!

  Professor…tem família?...tem amigos?...lazeres?...pode ter, só não é possível…ter tudo ao mesmo tempo…. um bom trabalho (bem pago...) e uma vida pessoal equilibrada.
O que vale, é que tenho um montão de férias…ah, pois é!
Mas isto é aqui para nós, que ninguém nos ouça.

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